Além da negativa repercussão internacional, o Paraguai começa a sentir diretamente as consequências do histórico – e rapidíssimo – impeachment do ex-presidente Fernando Lugo.
Os primeiro revés foi a suspensão do país do Mercosul (Mercado Comum do Sul) e da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) até as eleições presidenciais previstas para abril do ano que vem.
O encontro que decidirá o destino imediato do Paraguai está marcado para a próxima sexta, durante reunião do Mercosul, na Argentina. O Paraguai deve ficar de fora, embora seu novo chanceler já tenha dito que quer ir e explicar a crise em seu país. Enquanto isso, o presidente destituído do Paraguai, Fernando Lugo, anunciou que vai à reunião.
Outro golpe foi o anúncio feito pelo governo da Venezuela. O presidente Hugo Chávez disse que irá interromper o envio de petróleo ao Paraguai. Chávez ordenou ainda a retirada do embaixador venezuelano em Assunção – Brasil, Argentina e Uruguai também convocaram seus diplomatas instalados na capital.
“Vamos suspender o envio de petróleo, porque não vamos apoiar de forma alguma esse golpe de Estado. A partir deste instante, o ministro (Rafael) Ramírez tem ordens para cessar o envio de petróleo para o Paraguai – afirmou Chávez durante comemoração do Dia do Exército em seu país”.
O governo paraguaio, entretanto, afirma que não há motivo para alarme. Sergio Escobar, presidente da Petropar – a petroleira estatal do Paraguai –, disse que o país conta com 130 mil metros cúbicos de combustível em estoque, o que garantiria uma provisão por dois meses. Ao jornal paraguaio ABC, Escobar afirmou que o petróleo comprado da PDVSA, a estatal venezuela, representa cerca de 30% do mercado paraguaio.
Argentina, Venezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua e Cuba já disseram não reconhecer o novo governo paraguaio. Peru e México questionaram a rapidez do processo de destituição de Lugo, mas o México reconheceu a legalidade do processo. Um pouco mais distante, o Canadá se limitou a dizer que Lugo aceitou a sua saída e pediu calma no Paraguai, enquanto a Espanha afirmou que todos os procedimentos democráticos devem ser respeitados.
Rito sumário
Após a reunião ontem à noite no Palácio da Alvorada, o Itamaraty divulgou uma nota condenando o “rito sumário” que culminou com o impeachment e convocou, para consultas, o embaixador do Brasil em Assunção, Eduardo dos Santos.
Não foi usada a palavra “golpe” no comunicado do Ministério de Relações Exteriores porque o processo ocorreu dentro da lei.
Lugo diz que sofreu golpe e vai concorrer ao Senado
Deposto do cargo em um processo de impeachment feito em 48 horas, o ex-presidente do Paraguai Fernando Lugo pretende continuar na política e deve ser candidato ao senado nas próximas eleições gerais do país, em abril de 2013. Para Lugo, a posição da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e de países de peso como o Brasil e a Argentina, contrária a sentença do parlamento, revelam a fragilidade da democracia paraguaia. “Os países da região e da Unasul manifestaram-se quase de forma unânime rechaçando este golpe e isso é grave para a democracia paraguaia.”
Após ter que deixar o Palácio de López (sede do governo), Lugo retornou à sua residência, no município de Lambaré, na região metropolitana de Assunção. Na casa, com portão eletrônico e uma generosa varanda, há uma bandeira paraguaia hasteada e dois policiais armados fazendo guarda.
Na noite de sábado, o ex-presidente esteve na sede da TV Pública, criada em seu governo, onde estavam reunidos representantes de movimentos sociais e cidadãos que o apoiam.
Para o ex-bispo, o processo de impeachment não foi simplesmente um golpe para derrubá-lo, mas contra milhares de pessoas que o elegeram em abril de 2008. Lugo diz que não há alguém culpado pelo que ocorreu, mas critica a classe política paraguaia e partidos tradicionais. “Foi um complô não só de Federico, mas de uma classe política muito tradicional, muito ortodoxa, muito conservadora que não queria mudanças em favor da maioria”, afirma.
Lugo disse estar tranquilo e contou ter sido bem recepcionado pelos vizinhos em Lambaré, onde vive desde que entrou para a política. Ele diz que prega a não-violência e revelou que não ocorreram distúrbios graves após a decisão do Senado sobre o impeachment porque já se sabia que franco atiradores estavam preparados para conter qualquer ação de manifestantes.
Lugo também disse não há meios de reverter o juízo do parlamento paraguaio. No entanto, para ele, a resposta será dada nas urnas. “Em 21 de abril de 2013 mudaremos de novo a história”, afirma.