O personagem da matéria não tem nome. Poderia ser você, assim
como eu. Há um ano e meio, ele passou a vivenciar uma situação de assédio
moral, em um órgão da gestão municipal. No começo, a ferramenta nas mãos do
assediador foi a sonegação de informações ao funcionário, de maneira que as
tarefas não fossem bem cumpridas pela vítima.
O personagem da matéria não tem o nome revelado não apenas
para protegê-lo de eventuais retaliações em local de trabalho, de onde está
afastado temporariamente. Mas porque um servidor público, ou mesmo um
trabalhador da esfera privada, fica desfigurado na sua personalidade e autoconfiança
quando submetido a uma situação periódica de assédio moral em local de
trabalho.
“ Eu não conseguia
identificar o que era aquilo. Informações eram sonegadas (pela chefia) para
poder manipular as coisas”, revela, confessando à reportagem que passou a
sofrer paranóia depois dos episódios de assédio. As câmeras e a bolsa da Imprensa do Sismuc devem ficar longe do
local da entrevista, pela desconfiança que o entrevistado adquiriu com possíveis
gravações. Sua postura é de medo e insegurança.
O trabalhador narra que sempre colocou suas opiniões,
defendendo políticas e recursos para o setor onde atuava, mas a resposta era
retaliação e atropelo ao diálogo. Para ele, a motivação do assédio seria justamente
o fato de ele cumprir bem o seu papel. “Ficava sem informação. Comecei a ficar
paranóico. Virou um ambiente de ditadura militar, você passa a achar que
qualquer coisa está sendo gravada no celular contra você”, confessa.
Em muitos casos de assédio moral, há um componente,
identificado por especialistas, que associa o assédio ao cumprimento de metas e
à intensidade da produção. Porém, este caso do servidor público revela que o
problema não foi esse, mas o seu contrário. Como prática permanente, o
assediador não admitia o destaque e a competência do subordinado.
Mudanças
na produção e assédio
No cenário econômico brasileiro de uma década de produção
intensa e exploração da força de trabalho, o assédio moral tornou-se comum na
vida dos trabalhadores, a partir de metas de produção, tanto no segmento
público como no privado.
Trata-se de uma violência contra o trabalhador nas suas
relações pessoais, indicam especialistas no tema. Mesmo no aspecto preventivo,
a dificuldade é grande para se caracterizar o que seria uma atitude assediadora.
Este assunto também está ligado às relações de poder criadas no interior de uma
instituição — como é o caso do serviço público — e dentro da hierarquia de
trabalho. Na análise do deputado estadual Tadeu Veneri (PT), autor de
projeto sobre o tema, assédio e as novas formas de organização do trabalho no
Brasil são duas coisas que andam juntas desde os anos 1990.
“Tiramos leite de pedra, mesmo com zero de orçamento fiz muitas coisas, tenho conhecimento e não teria chegado aqui se não o tivesse. Mas ele era uma cobra mordendo onde podia, para solapar a parte profissional”
Deputado tem projeto de lei paralisado desde 2001
No plano institucional, não há leis que regulamentem o assédio moral. O deputado estadual Tadeu Veneri (PT) teve por duas vezes um projeto de lei que regulamenta o assédio moral aprovado no Legislativo e vetado pelo poder Executivo. Isso já ocorre desde 2001, quando Veneri ainda estava na condição de vereador.
O projeto segue paralisado. “Sempre vai ser vetado pelos governadores, seja quem for”, reclama o deputado e atual líder da oposição na Assembleia Legislativa. Mesmo assim, o parlamentar defende que o principal é gerar debates sobre o assunto com a sociedade, compreendendo o assédio moral em todas as suas dimensões.
Neste terreno em que faltam proteções e garantias, o funcionário assediado deve buscar orientação no sindicato de referência. Pesquisadores não acreditam que o tema deva ser resolvido apenas na ação judicial, mas a partir da organização nos locais de trabalho. O Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, por exemplo, possui um canal de denúncias que podem ser feitas de forma anônima e acompanhadas em todo processo pelo trabalhador.