Lixão irregular coloca famílias sem-teto em risco de despejo – segunda matéria da série

A Revita Engenharia faz parte do Grupo Solví, controlador de
empresas que atuam nos segmentos de Resíduos, saneamento e engenharia. O grupo mantém operações em mais de 171 cidades brasileiras.
Este é o principal grupo controlador da empresa Essencis.

O segundo maior aterro privado de Curitiba e Região
Metropolitana apresenta como principais problemas o fato de, desde 1996, receber
os chamados resíduos industriais tóxicos perigosos e não perigosos.

A sociedade até o momento não tem acesso à lista de quais
resíduos industriais são levados ao aterro, filtrados, processados e despejados
na forma de chorume (líquido proveniente do lixo) em três corpos de rio, com
respectivas nascentes. O aterro da empresa Essencis localiza-se a pouco mais de um quilômetro da Represa
do Passaúna, que abastece um milhão de moradores. A reportagem do Sismuc teve acesso a fotos e imagens sobre o chorume lançado nos rios após tratamento.

Moradores das vilas Esperança e Nova Conquista, organizados
em associações de moradores locais, na Cidade Industrial de Curitiba (CIC), denunciam,
desde 2014, mau odor, queimas de lixo durante a madrugada, incêndios e
explosões ocorridas nos barracões da Essencis. 

“Há um documento do Instituto das Águas do Paraná que
constatou a existência dos corpos hídricos. O MP sabe da existência. A alegação
muitas vezes é de que o rio Barigui já está poluído, como se o chorume limpasse
a contaminação que chegou até ali. Vale lembrar que, embora seja uma licença
prévia, os impactos são permanentes na região”, afirma Jadir de Lima, da Ong Aliança para o Desenvolvimento Comunitário da Cachimba
(Adecom).

Lima afirma que a gestão municipal, por não controlar um
trâmite que está nas mãos da iniciativa privada, tampouco tem informação sobre
isso. “Como se licencia empreendimento de alto potencial poluidor e não se tem
controle do que entra e do que sai?’”, critica.

Já a resposta da gestão à Imprensa do Sismuc diz: “Resíduos oriundos da Limpeza Especial (roçada, terra,
areia, detritos em geral), estes são depositados na parte de Aterro Sanitário,
propriamente dito. Também existe uma parte do aterro preparada para resíduos
especiais que exigem cuidados diferenciados. O aterro não se localiza na bacia do
Passaúna”, afirmou por email a assessoria da secretaria municipal de Meio Ambiente. 

Aterro se amplia para área irregular da empresa Stirps 

Os conflitos não acabam por aí. Há uma farta documentação de
irregularidades constatadas no documento intitulado “Dossiê Stirps”, que em
linhas gerais aponta as licenças ambientais concedidas pelo Instituto Ambiental
do Paraná (IAP) de forma irregular.

O documento denuncia também o corte de 3200 árvores do
chamado “bosque relevante” pela Essencis. O local onde a Essencis está
localizada e a sua cobertura vegetal pode ser caracterizada como local de
nascentes e biomas de Mata Atlântica. “Imagine se um cidadão comum tivesse cortado,
o que ia acontecer?”, provoca Lima, da Adecom, um dos autores do relatório. 

Por último, denúncia também a expansão para terreno da empresa Stirps,
configurada como massa falida. Na página 6 do dossiê, acusa a Essencis de ter sido dispensada
ilegalmente de apresentar os Estudos e Relatórios de Impactos Ambientais
Eia/Rima para a ampliação do seu aterro sanitário industrial. Com mais de 200
toneladas dia, já seria o suficiente para exigir Estudo prévio de Impacto
Ambiental (EIA-Rima). “É obrigatório apresentar o Estudo de Impacto Ambiental”,
critica Lima.

A resposta oficial da Prefeitura sobre a concessão de
licenças afirma a legalidade do contrato. “A empresa obteve licença prévia do Instituto Ambiental do Paraná
(IAP) em 11/01/2012 e a partir desta autorização foi emitida a licença de
instalação pela SMMA. As questões apontadas estão sendo tratadas na esfera
judicial, não cabendo manifestação desta Secretaria”.

No entanto, a Adecom critica o fato de a empresa ter feito
pedido de licença junto ao Instituto Ambiental do Paraná (IAP), quando a
competência era da SMMA. Na avaliação da entidade, não foi revelada ao IAP a
situação irregular do terreno da Stirps. “Não apresentaram documento no IAP de
que o terreno apresentava irregularidades. A competência também não era do IAP.
Sabiam da situação do imóvel e entraram com pedido de licença prévia do IAP.
Depois foram à SMMA e deram licença de instalação. Não se pode licenciar em
dois níveis”, denuncia Lima. 

A assessoria da SMMA afirma ainda que a Essencis teria
preenchido os requisitos legais e teria sido cadastrada em 2010 pelo Consórcio
Intermunicipal para a Gestão de Resídos (Conresol) para atender a destinação de
resíduos.

Apesar da negativa da Prefeitura, a proximidade entre aterro
e represa do Passaúna é evidente em uma consulta ao simples Google Maps. O “Dossiê Stirps” sugere ainda que o fato de ser um
aterro também de lixo residencial atrai urubus, que sobrevoam e recorrem à represa do Passaúna, tornando-se um agente contaminador das águas consumidas
pela população curitibana.

Área para o lixo ou para a moradia?

O terreno, pertencente à sociedade empresarial Stirps
Empreendimentos e Participações Ltda, possui 145 mil metros quadrados. Em parte
dele, hoje perto de 800 famílias estão ocupadas desde o dia 17 de abril. As
famílias buscam acesso a programas de moradia Minha Casa, Minha Vida – módulo
entidades.

As lideranças do Movimento Popular de Moradia (MPM), que coordena a
ocupação, defendem que está no objetivo da empresa expandir para esta área, daí o risco de o leilão da área da Stirps, requisitado pela Justiça, poder ter a própria Essencis como principal compradora. 

O MPM critica também a perspectiva da Prefeitura de Curitiba de renovação dos contratos dos aterros sanitários de Curitiba com os mesmos
grupos empresariais:

“Licitação de seis milhões para chegar a uma conclusão obvia
que todos sabemos o que é. O Banco Mundial vai dizer que precisa de parceria
público-privada, renovar com a Estre e Essencis. Querem ampliar
justamente na área em que a gente está. Eles podem perder uma licitação de
milhões. Já estavam jogando lixo no terreno de trás (ao nosso)”, diz a
coordenação do MPM.

(Foto do Movimento Popular de Moradia em frente à Essencis: Joka Madruga)