No dia 27 de outubro de 2016 foi julgado pelo Supremo
Tribunal Federal o Recurso Extraordinário 693456/RJ, com repercussão geral
reconhecida, e que trata de desconto dos vencimentos dos servidores públicos em
razão da realização de greve.
A decisão tem causado grande inquietação entre advogados e
dirigentes de entidades sindicais e servidores públicos como um todo. É preciso
fazer uma análise mais cuidadosa para não fortalecer uma tese que pode mitigar
em muito o direito de greve dos servidores públicos conquistado em 5 de outubro
de 1988.
Ouso dizer que a decisão cria obstáculos ao direito de greve
dos servidores públicos, mas fortalece a necessidade de negociação coletiva
efetiva e regulamentação da Convenção 151 da OIT – Organização Internacional do
Trabalho. Destaco que são interpretações preliminares e certamente outras virão
para enriquecer o debate e aperfeiçoar os entendimentos.
Direito de greve
“O texto que garantiu o direito de greve foi aprovado pela
Assembleia Constituinte no dia 18.08.1988, e com a promulgação da Constituição,
em 5 de outubro de 1988, pela primeira vez em nosso país a greve passava a se
constituir uma garantia social do servidor público. Um avanço histórico, um
marco que, aliado a outras garantias, também concedidas a tal categoria, tornou
a vida funcional do servidor público mais protegida dos abusos administrativos
que até então perduravam. A ideia de libertação do regime ditatorial se
apresentou mais marcante na anistia, concedida pelo Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, a qual foi estendida aos servidores públicos
civis e empregados públicos que tivessem sido punidos em virtude de participação
em movimento grevista”.
Mesmo existindo restrições antes de 1988, os servidores
organizavam-se em associações em todos os entes da Federação. Da mesma forma,
greves eram realizadas por servidores públicos federais, estaduais e
municipais, cada uma com sua diferenciada capacidade de organização.
O inciso VII do artigo 37 da Constituição Federal consagrou
o direito fundamental de greve aos servidores públicos: “O direito de greve será exercido nos termos
e limites definidos em lei específica”.
O texto de 1988 foi rapidamente cercado de algumas polêmicas
dificultando inicialmente seu pleno exercício. Para Adilson Abreu Dallari, o
inciso seria de eficácia limitada, portanto, o seu exercício dependia da nova
norma. Para Ele, “no caso em exame já
existe um condicionamento no próprio texto constitucional. É como se a
Constituição tivesse dito que reconhecerá e dará suporte, no futuro, a um
direito de greve dos servidores públicos, que vier a ser definido pelo legislador
complementar. Não há um direito restringível, mas uma norma condicionada ao
implemento de uma condição, qual seja, a edição de lei complementar”.
A tese da norma com eficácia limitada constitui-se em
fundamento para inibir o exercício do direito de greve dos servidores,
declarando-se ilegais as greves por falta da lei complementar. O desconto dos
vencimentos correspondentes aos dias das greves passou a ser uma consequência
natural da interpretação restritiva ao direito.
A decisão do STF
Verifica-se que a recente decisão do Supremo Tribunal
Federal consolida um entendimento que já vinha sendo adotado por juízes
singulares, desembargadores monocraticamente, tribunais de justiça, tribunais
regionais federais, Superior Tribunal De Justiça e até o próprio Supremo
Tribunal Federal. Isso dificultou, mas não impediu que os servidores públicos
realizassem suas greves.
Sobre a
impossibilidade de descontos dos dias de greve se ela foi realizada em razão de
conduta ilícita do Poder Público, já tinha decidido o STF nos mandados de
injunção 670, 708 e 712. Atrasos no pagamento dos vencimentos, progressões e
revisões gerais da remuneração previstas em lei parece-me que estão no rol das
condutas ilícitas.
A decisão do STF na repercussão geral impõe alguns desafios
e algumas constatações a nós advogados, dirigentes sindicais e servidores
públicos que pensam sobre o tema e exercem o direito de greve.
A primeira e maior conclusão é de que a judicialização da
greve e outros movimentos dos servidores públicos não interessa a esses
trabalhadores, pois a chance de as decisões serem favoráveis ao Poder Público ganhou
maior força.
Ouso dizer que a decisão cria obstáculos ao direito de greve dos servidores públicos, mas fortalece a necessidade de negociação coletiva efetiva e regulamentação da Convenção 151