A professora Bárbara Guerra, 37 anos, chama os alunos a responderem mais alto ao jongo [dança de origem africana com acompanhamento de tambores] que o grupo ensaia para a festa do Dia da Consciência Negra, na Ilha da Marambaia. O tempo está nublado e os remanescentes quilombolas dançam e batem o atabaque em meio a prédios da Marinha do Brasil e serras cobertas de Mata Atlântica.
O cenário é a Praia Suja, na Baía de Sepetiba. Perto dali, paredes de pedra ainda guardam a história da antiga senzala em que os negros em quarentena esperavam para ser traficados, depois de terem sido sequestrados da África para nunca mais retornar.
“Eu nasci, nasci de Angola. Angola que me criou. Hoje estou na Marambaia, moreno. E por isso negra sou”, canta Bárbara para que o grupo repita e para embalar os passos que resgatam a dança de seus ancestrais.
A resposta ao chamado da griô [contadora de histórias] ganha força e se soma às vozes que nas últimas décadas trouxeram de volta o jongo, a capoeira, o carnaval e o reconhecimento de que há uma história a ser contada na ilha.
“A importância disso tudo não é manter, é continuar a história, porque sem história nós não somos nada. Falam que quem escreve a história são os vencedores, mas cada um pode escrever sua história. No momento em que você escreve sua história, você já é um vencedor.”
No mês da Consciência Negra, a comunidade quilombola da Marambaia tem mais vitórias a celebrar. Depois de uma disputa judicial com a Marinha que se estendeu por mais de dez anos, um Termo de Ajustamento de Conduta assinado no fim do ano passado entre as duas partes pôs fim ao litígio. Além da herança quilombola, a ilha abriga desde a década de 1970 o Centro de Adestramento da Ilha da Marambaia, onde são realizados treinamentos militares.