Com ondas de calor cada vez mais severas, climatização na rede pública de Curitiba avança, mas ainda deixa milhares expostos

Com a intensificação das ondas de calor em Curitiba, impulsionadas pela crise climática global que tem elevado as temperaturas médias e provocado recordes consecutivos na cidade, crescem ano após ano também as denúncias de servidores sobre ambientes abafados, insalubres e sem manutenção adequada. Diante da pressão dos trabalhadores e da atuação do SISMUC, a Prefeitura anunciou recentemente o início da instalação de ar-condicionados na rede municipal. A medida representa um avanço histórico, mas ainda insuficiente para responder ao quadro atual de calor extremo.

Segundo a gestão, a implantação dos aparelhos começou neste ano, porém alcançando apenas 155 escolas e CMEIs, número reduzido, que não atende o todas as 441 escolas municipais, Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) e Centros Municipais de Atendimento Educacional Especializado (CMAEEs). Para 2026, o município informou que incluirá mais 150 escolas, sem detalhar quais unidades serão contempladas. Ainda segundo a administração, os critérios para implantação dos equipamentos se baseiam no plano climático municipal, que identifica maior risco de calor em regiões como Boqueirão, Hauer, Xaxim, Rebouças, Centro, Cajuru e Capão da Imbuia.

A coordenadora de Saúde do Trabalhador e Meio Ambiente do SISMUC, Wanderly Machado, questiona a ausência de respostas para as unidades que seguirão expostas ao calor no próximo ano letivo. “Quais medidas serão adotadas nas unidades que não serão contempladas neste verão que se aproxima? Estaremos em pleno ano letivo e não teremos ar-condicionado em todas as escolas. É importante destacar que as temperaturas têm aumentado ano após ano, batendo recordes históricos, como os 31 graus registrados em 2024 e os 35 graus da semana passada”. Para ela, a prefeitura precisa apresentar um plano transparente e de adaptação climática capaz de proteger trabalhadores e estudantes diante da intensificação das ondas de calor.

Dados do Censo Escolar de 2022, revelou a urgência do problema: somente 1% das 4.379 salas de aula da rede municipal eram climatizadas, muitas delas com turmas numerosas e circulação mínima de ar. As ondas de calor prolongadas tornam esse cenário ainda mais crítico não só para as crianças e famílias, mas também para os servidores que atuam nestas unidades educativas.

Outras áreas também sofrem com o calor extremo
Enquanto parte da educação começa a receber os equipamentos, outras áreas permanecem em situação crítica. Nos CRAS, CREAS e serviços voltados à população em situação de rua, trabalhadores relatam ambientes insuportáveis, sem ventilação adequada e sem recursos que amenizem a exposição prolongada ao calor. Equipes da Fundação de Ação Social também penam, ao permanecer por longos períodos em veículos, nas ruas de Curitiba, onde a temperatura interna supera facilmente a sensação térmica externa.

A realidade é semelhante nas unidades de saúde. No ano passado, o SISMUC realizou visitas às UPAs, unidades básicas e ao Laboratório Municipal e constatou que muitos espaços não possuíam ventilação adequada. Apenas salas odontológicas e alguns espaços de vacinação tinham ar-condicionado, o restante dependia de ventiladores insuficientes ou sem manutenção, agravando os riscos de exaustão térmica e comprometendo a qualidade do atendimento.

A urgência é reforçada pelos dados internacionais. Relatório da ONU, elaborado com apoio da Organização Meteorológica Mundial, projeta 66% de probabilidade de que a média anual de aquecimento ultrapasse 1,5 grau entre 2023 e 2027, ampliando a frequência de eventos climáticos extremos, como as ondas de calor que já atingem a capital. Essa realidade se materializa diariamente nos serviços públicos, com a ausência de climatização adequada, manutenção contínua e EPIs, expondo profissionais a riscos fisiológicos importantes, que incluem desidratação, exaustão térmica e impactos cardiovasculares.

Wanderli ressalta que enfrentar a crise climática exige medidas integradas e permanentes. Ela afirma que “não basta instalar ar-condicionado; é necessário investir em soluções que garantam conforto térmico às pessoas, como plantio de árvores, isolamento térmico, sombreamento, ventilação cruzada, água fresca com temperatura adequada e manutenção predial contínua”. Para ela, embora a implantação parcial anunciada pela prefeitura seja uma conquista respaldada por legislações como a Constituição Federal, a CLT e a NR 17, ela ainda está distante das necessidades reais diante da nova realidade climática.

A coordenadora reforça que o SISMUC continuará cobrando que toda a rede de educação, saúde, assistência social e demais setores do serviço público sejam contemplados. Para ela, a meta deve ser garantir condições dignas de trabalho e ambientes adequados para a população e os servidores públicos, especialmente num cenário de calor extremo que tende a se agravar nos próximos anos.