Me agredir não resolve o problema

A
violência no Brasil tem crescido. De acordo com Fórum Brasileiro de Segurança
Pública, houve 15.932 mortes decorrentes de crimes violentos intencionais
(homicídios dolosos, lesões corporais seguidas de morte e latrocínios). Entre
as principais vítimas estão os jovens. Dados do Mapa da Violência de 2015 apontam que em “1980 as mortes
violentas representavam 6,7% do total de óbitos na faixa de 0 a 19 anos de
idade. Em 2013 a participação elevou-se de forma preocupante: atingiu o patamar
de 29%. Tal é o peso das causas externas, que em 2013 foram responsáveis por
56,6% do total de mortes na faixa de 1 a 19 anos de idade”, aponta o
pesquisador Julio Jaobo Waiselfisz. As agressões a mulheres também preocupa.
Segundo ele, “entre 2003 e 2013, o número de vítimas do sexo feminino passou de
3.937 para 4.762, incremento de 21,0% na década. Essas 4.762 mortes em 2013
representam 13 homicídios femininos diários”.

 Por outro lado, existe um tipo de violência que não aparece
de forma detalhada nas pesquisas. Trata-se de agressões físicas contra os
trabalhadores. Frequentemente, servidores públicos, bancários, professores,
jornalistas e profissionais que lidam com o público sofrem com algum tipo de
agressão física ou moral. Contudo, o poder público, os empresários e os
representantes da categoria são omissos tanto no combate quanto em campanhas de
conscientização da população. E nesse “vácuo” de política, os casos ocorrem
quase que “isoladamente”.

É o caso dos profissionais da saúde. Eles são alvo de
pacientes devido à demora no atendimento. A falta de condições de trabalho e
recursos acaba desaguando nesses trabalhadores, como conta a técnica de
enfermagem da Prefeitura de Curitiba Fátima Carvalho: “Um paciente psiquiátrico
bateu na minha cara, me jogou na parede e tentou me furar com uma caneta.
Fiquei em pânico e ate hoje sofro com isso. Fora agressões verbais por falta de
condições de trabalho, médicos etc. Os acompanhantes começam a ferver tentando
filmar e nos deixam constrangidos com gritos e ameaças, revela.

Em outro caso, uma servidora municipal conta que chegou a
fazer boletim de ocorrência, mas que faltou assistência da Prefeitura de
Curitiba. “Fiz BO e abri representação contra a usuária sem nenhum apoio da
PMC. Foi registrado CAT (comunicado de acidente de trabalho) mais a perita me
liberou para o trabalho no dia seguinte alegando que a agressão não era motivo
de afastamento”, lamenta a enfermeira Debora Stremel. De acordo com o
JusBrasil, a violência no local de trabalho podem gerar efeitos traumatizantes
para os trabalhadores. “Nos casos de agressão física no ambiente de
trabalho, o empregador deve responder pela conduta irregular do empregado
agressor”, define a legislação.

A omissão do poder público vem de longa dada. O Sindicato dos Servidores Municipais de
Curitiba (Sismuc) possui diversos registros de agressões físicas. Em 2013, um
usuário destruiu a recepção da US Salvador Allende. As pessoas que estavam na
recepção contam que o usuário portava uma receita médica vencida. Ele foi
orientado a fazer novo agendamento, mas insistiu em esperar pelo encaixe para
receber o remédio. Cerca de 10 minutos depois, Manoel José Borges perdeu o
controle e começou a destruir o local.

m pouco mais distante, em 2010, o fiscal do urbanismo
Antonio Gabriel Dybax foi agredido ao apreender um cavalete de publicidade
colocado em local irregular. Esta não é a primeira vez que ele é agredido. Em
1999 ele chegou a ser esfaqueado quando abordava vendedores ambulantes. Segundo
ele, “de cada 100 pessoas que você aborda, 30% reage de uma forma violenta”.

Prefeitura de
Curitiba previne agressões

A Prefeitura
de Curitiba alega que monitora casos de agressões a servidores municipais.
Desde 2015 os servidores vítimas de situações traumáticas no exercício de suas
atribuições profissionais vêm sendo atendidos pelo Departamento de Saúde
Ocupacional da Secretaria Municipal de Recursos Humanos, que desenvolve ações
de prevenção ao transtorno do estresse pós-traumático.

Caso o
trabalhador sofra agressão, ela deve fazer registro de acidente e “se
apresentar à Perícia Médica do Município munido da CAT e demais documentos. A
partir daí, será encaminhado para a equipe psicossocial da Saúde Ocupacional,
que prestará o acolhimento e atendimento do servidor. O servidor será
reavaliado em aproximadamente 30 dias e monitorado pelo tempo que for
necessário”, relata Maria de Lourdes Santos Iargas D’avila, Diretora de Saúde
Ocupacional. Por fim, a gestão municipal afirma que “vem sensibilizando
gestores de diferentes áreas da administração municipal, por meio de
capacitações que abordam desde a forma de acolher um servidor nessa situação,
até os procedimentos pertinentes à Saúde Ocupacional”.

Agressão a servidor é crime

Como proceder:

Registrar Comunicado de Acidente de Trabalho;
Fazer boletim de ocorrência na delegacia mais próxima e isso já pode gerar uma ação criminal;
Pode processar a pessoa por danos morais e até materiais, se for o caso, no juizado especial cível, pedindo indenização;
Deve avisar imediatamente a chefia para que adote providências;
Se estiver inapta para o trabalho ou precisar de repouso o médico que atender poderá conceder licença para tratamento de saúde;
Pode denunciar as condições de trabalho e prestação de serviços ao Ministério Público Estadual;
Por fim, se o dano decorreu de ação ou omissão do município, pode processar também a prefeitura.

Combate à violência é pequeno e “desorganizado”

Os bancários também são vítimas de agressões. Segundo o sindicato da categoria, na falta de funcionários nas agências, muitas vezes, os bancários que desempenham a função de caixa (atendimento pessoal) não têm condições de atender todos dentro do prazo previsto, o que gera longas filas de espera e revolta entre clientes e usuários. Em caso de violência, o bancário deve procurar a Secretária de Saúde da entidade. “O sindicato, após receber tais denúncias e relatos, procura a Superintendência do banco para exigir mais trabalhadores na unidade, pois esta é a raiz do problema”, orienta Fideli, secretária de Saúde do Sindicato dos Bancários de Curitiba.

Outra categoria constantemente agredida é a dos professores. Segundo o coordenador de comunicação da APP Sindicato, Luiz Fernando Rodrigues, “a escola reflete a violência de seu entorno. Esta violência necessita da atuação do Estado através de políticas públicas para combatê-la”, avalia. No caso de agressões sofridas, há duas situações distintas. Se o estudante for menor de idade, o primeiro procedimento é o registro em ata na própria escola e a convocação dos pais e ou responsáveis. Se a agressão for física, a direção da escola deve convocar a patrulha escolar e fazer o registro da ocorrência. No caso do aluno ser maior de idade o procedimento é o registro do boletim de ocorrência na delegacia. “Em todos os casos, a APP-Sindicato orienta estes procedimentos além de um processo administrativo a ser encaminhado ao núcleo regional de educação. No caso do servidor se sentir ameaçado e sentir a necessidade de mudança de local de trabalho também realizamos este acompanhamento”, explica Luiz Fernando.

Mesmo assim, para a Central Única dos Trabalhadores, ainda falta uma unificação dos dados e orientações por parte das entidades sindicais. O Secretário de Saúde do Trabalhador Gilberto Salviano da Silva explica que na administração publica não existe um sistema de informação que centraliza os dados estatísticos de doenças, acidentes e afastamentos do trabalho dos trabalhadores estatutários. Por isso, “a recomendação é que os sindicatos sistematizem em suas secretarias de saúde dados sobre agressões físicas contra os trabalhadores. A gente entende como acidente de trabalho, porque as agressões ocorrem no ambiente de trabalho. Isto é um aspecto legal”, observa.

Mapa da Violência no Brasil

Casos de agressão contra servidores

2016 – auxiliar de enfermagem é agredida na US Bairro Alto



2015 – Agente Administrativa é agredida na UPA Fazendinha. Nesta unidade ocorreu a morte de um paciente e a Prefeitura responsabilizou a equipe por negligência.



2014 – US Barigui é assalta. O local foi assalto mais de 5 vezes em apenas um mês.



2014 – Guarda municipal é agredido ao tentar separar brigões em terminal de ônibus.



2011 – Cmum faz paralisação após agressão contra enfermeira.



2010 – Agressão no Cmei Pantanal assusta pais e educadoras.

Agressão a funcionário público é considerado crime por desacato, segundo o artigo 331 do Código Penal. A pena prevista é prisão de seis meses a dois anos ou multa.

Agressão a funcionário público é considerado crime por desacato, segundo o artigo 331 do Código Penal. A pena prevista é prisão de seis meses a dois anos ou multa.

Cresce violência contra jornalistas

O atual clima político no Brasil tem feito crescer também as agressões contra jornalistas no país. De acordo com a Federação Nacional dos Jornalistas, ocorreram 137 ocorrências de agressões no exercício da profissão em 2015, oito a mais do que as 129 registradas no ano anterior. Entre as violências sofridas pelos jornalistas em 2015, grande parte delas foi registrada em manifestações de rua. “Precisamos retomar a discussão sobre as condições necessárias para o exercício do Jornalismo e para a garantia das liberdades de expressão e de imprensa no Brasil”, declara Maria José Braga. No ano passado, o Sindijor-PR lançou a campanha “Basta de agressões a jornalistas”. Parte dessa campanha é voltada para orientar manifestantes e o poder público sobre o direito a informar. Há um ano, no Massacre do Centro Cívico, repórteres fotográficos foram alvos de bala de borracha da PM e um cinegrafista de uma emissora foi mordido por um cachorro da PM. Não houve relato de jornalistas agredidos por manifestantes.