Câmara itinerante pauta reforma conservadora nos estados

Ocorreu hoje (20), na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), o lançamento do programa Câmara Itinerante, que vai levar deputados federais a diversas cidades do País. Segundo a agência de notícias da Câmara, os debates deverão se concentrar em temas como a reforma política e o pacto federativo.

“Vamos abrir os debates, fazer essa ampla discussão com a sociedade e permitir a participação de todos”, propôs Eduardo Cunha, presidente da Câmara. Entretanto, não foi isso que os representantes de movimentos sociais identificaram no plenário da casa. “Pra começo de conversa, a audiência ocorreu em horário comercial, o que impede a participação de trabalhadores”, critica Adriana Claudia Kalckmann, coordenadora do Sismuc.

“Aquilo deixou de ser uma audiência pública ao longo da realização. Tivemos apenas um minuto para fazer uma pergunta e não nos permitiram fala ou sugestão. Em uma audiência pública, conforme este evento foi publicizado, deveríamos poder colocar propostas e participar dos debates. Não foi o caso”, condena Liliane Coelho, da secretaria operativa no Paraná do Plebiscito pela Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político.
Na formulação da pergunta de um minuto a que teve direito, ela criticou a representatividade dos parlamentares eleitos por meio do financiamento empresarial de setores como o agronegócio, os fundamentalistas religiosos, corporações e outras empresas como as de segurança privada. “Essa configuração atual do congresso não corresponde aos anseios da classe trabalhadora, mas sim pretende legislar em causa própria e viabilizar os interesses de seus financiadores de campanha”, apontou. Para os movimentos sociais, o Congresso Nacional não será capaz de fazer uma reforma política para aperfeiçoar e consolidar a democracia recentemente conquistada.

Cerca de 30 militantes acompanharam a seção, em que deputados elogiaram uns aos outros por estarem levando o debate à casa do povo. O povo, entretanto, não estava em casa. “Não temos registro de protocolo das nossas reivindicações. É ridículo da maneira como isso tudo foi colocado. A sociedade deveria ter sido mais ouvida. Pagar viagem pra deputado vir aqui falar não é autêntico. É ridículo. Dessa forma não vamos ter reforma nenhuma”, disse o professor Artur Conceição.

Como Eduardo Cunha não deu fala ao trabalhador, ele precisou gritar no plenário para ser ouvido. O presidente da Câmara solenemente o ignorou e apenas retrucou a fala de Liliane: “Se não temos competência para legislar, então não temos competência para entrar neste debate”. O presidente da Alep, Ademar Traiano (PSDB), solicitou aos seguranças da Casa que o professor fosse retirado do plenário.
Reforma ou retrocesso?
Dois peemedebistas acompanharam Cunha na viagem de Brasília a Curitiba. Marcelo Castro, relator da comissão especial de reforma política (PECs 344/13, 352/13 e outras) na Câmara dos Deputados, apontou problemas e propôs soluções para o sistema eleitoral. A influência do poder econômico e as coligações seriam problemas. O voto distrital e as eleições casadas, seriam soluções.
“O eleitor vota no Pedro para eleger o João”, problematizou. Segundo o parlamentar, o voto distrital traria os políticos mais para perto do eleitor. E a realização de todas as eleições de uma vez só seria uma forma de harmonizar os projetos políticos entre as esferas federal, estadual e municipal. Já para os movimentos sociais que defendem a reforma política popular, este não é o caminho.

“O voto distrital aumenta a influência de representantes com maior poder econômico, que historicamente já têm renome e condições de autopromoção, ou de seus apadrinhados, no próprio distrito”, aponta Liliane. Para ela, isso aumentaria o problema dos “currais eleitorais”, redutos onde certos políticos consolidam vantagem eleitoral em troca de benefícios. Além disso, a eleição casada também não representaria solução. “Realizar os pleitos todos de uma só vez desfocaria o debate da esfera local para fortalecer as campanhas presidenciais. Além disso, não contribui para a conscientização política do eleitor, pois aumenta o tempo entre a realização de eleições, o que dilui o debate”, conclui ela.
Federalismo
Danilo Forte (PMDB-CE), presidente da comissão especial que vai analisar propostas para redefinir o pacto federativo, defendeu que o principal problema a ser resolvido é a distribuição equilibrada dos recursos arrecadados. “A lei federal muitas vezes impede a arrecadação tributária estadual. Queremos a emancipação dos entes federativos”, defende. O deputado exemplificou a interferência da União na criação de novos municípios e advogou por maior autonomia aos estados. O Paraná tem 399 cidades.
“Mas o problema do sistema tributário não tem a ver com o pacto federativo. Até porque o pacto federativo não se limita à questão financeira. As distorções que ocorrem têm mais a ver com o fato da carga tributária ser relativa ao consumo e não à riqueza”, discorda Liliane. Ela explica que o sistema tributário é fruto do Decreto-lei nº 82 de 1966, promulgado pelo ditador Castello Branco. “A Constituição de 1988 se limitou a não recepcionar aquilo que o Código Tributário Nacional não tratava como receita do município, já que as cidades passaram a ter autonomia financeira. Fora isso, herdamos um sistema da ditadura”, conclui.
Portanto, neste quesito, ela afasta a questão do pacto federativo e aponta para a taxação de grandes fortunas, tributação que é previsa na Constituição, mas que ainda não foi regulamentada por lei federal. E que a carga tributária precisa ser drasticamente reduzida com relação ao consumo, como é na Comunidade Européia, por exemplo. Ela destaca: “Nesses paíeses, a maior carga tributária recai sobre as riquezas e não sobre o consumo. No Brasil, por outro lado, as classes mais baixas arcam com muito mais impostos do que as mais ricas”.