A escola às avessas: Um projeto travestido

Os
projetos de lei que tentam instituir a “Escola sem partido” é
controverso desde a sua criação até as justificativas. Em plano
nacional, ele é tratado no projeto de lei 193/2016, de autoria do
senador Magno Malta (PR-ES), integrante da bancada evangélica. Já
em Curitiba, o projeto foi apresentado na
Câmara
Municipal pelo vereador Thiago Ferro (PSDB), que é bispo da
Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra.

O
próprio nome já é um equívoco. Seus artigos tratam principalmente
sobre sexualidade e gênero. Essa denominação foi inspirada em um
projeto que circulou no Senado Federal em 1997. Segundo Miguel Nagib,
“quando o professor de história de sua filha comparou Che Guevara,
(um guerrilheiro que se dedicava às suas utopias comunistas e matava
pessoas no curso da revolução) a São Francisco de Assis (um santo,
que pregava amor ao próximo, amado por toda a igreja)”.

Surge
aí a primeira controvérsia nas justificativas para a criação da
lei, que vêm travestida de “apartidária” e “plural” para
ganhar o apoio popular. Contudo, os autores dos projetos pertencem a
partidos políticos, são pastores evangélico e trazem no bojo dos
projetos suas concepções políticas, religiosas e morais.Além disso, o projeto é apoiado pelo Movimento Brasil Livre (MBL) e
por Revoltados online, que foi responsável por articular o encontro
de seus representantes, mais o ator pornô Alexandre Frota com o
ministro da Educação, Mendonça Filho.

Outro
apoiador do projeto é o deputado federal Jair Bolsonaro (PEN-RJ),
que têm suas convicções políticas bem claras. Entre suas falas
polêmicas, podemos citar que ele “seria incapaz de amar um filho
homossexual. Prefiro que um filho meu morra num acidente do que
apareça com um bigodudo por aí”. Ou “eu não corro esse risco,
meus filhos foram muito bem-educados”. Não bastasse a homofobia, o
deputado porta-voz do “escola sem partido” é partidário do
machismo. “Mulher deve ganhar salário menor porque engravida”,
afinal, “quando ela voltar [da licença-maternidade], vai ter mais
um mês de férias, ou seja, trabalhou cinco meses em um ano”.

Outra
questão contraditória

refere-se
à defesa da pluralidade no ensino.
O
autor
do projeto, senador Magno Malta, trata como “doutrina esquerdista”.

O
quê não deixa claro, p
or
exemplo, em uma família onde os pais acreditam que o mundo foi
criado tal como descrito na bíblia do Gênesis, se eles podem
questionar na justiça o professor de Biologia porque ele ensina o
conceito de evolução das espécies. Ou se uma família de esquerda
pode levar um professor de história de direita à justiça caso ele
ensine algo que vá contra os seus princípios.

Sendo
assim, se percebe que a ideia central que se quer passar com o
projeto é a desvinculação entre os conhecimentos científicos e os
posicionamentos ideológicos, políticos e culturais, alegando que os
professores estão se aproveitando de seu ofício para repassar aos
alunos suas ideias políticas e morais. Na prática, o

que se vê, no entanto, é que o “Escola sem partido” pretende
promover censura a liberdade de pensamento e a autonomia pedagógica
no ambiente escolar.Perseguir e demitir os docentes
que defendem uma visão de mundo contrária ao “poder vigente” é
muito perigoso. Sem contar os riscos que são definir, a partir de um
único ponto de vista, o que é considerado ideológico e o que é
válido como conhecimento científico, limitando assim os saberes.

Escola
sem perseguição

A
questão mais assustadora do projeto é a que se refere à questão
de gênero e sexualidade. A justificativa para impedir o debate é
arraigada em c
onvicções
morais, preconceituosas, homofóbicas e racistas que devem ser
desconstruídas.
Primeiro
porque não há base em pesquisa para afirmar que a orientação
sexual seja influenciável por alguém. Segundo porquê a inclusão
da diversidade cultural na escola é vista como uma conquista do
respeito às raízes históricas. Ou seja, ninguém vai virar índio
por estudar a questão indígena no Brasil, tampouco vai “mudar de
time” porque estudou regras de futebol.

A
educação brasileira tem dezenas de problemas graves, complexos e
bem conhecidos. Aprovar esse tipo de lei é mais um retrocesso e uma
afronta aos avanços conquistados. Os pais e os educadores devem se
debruçar em combater o racismo, em mostrar que ser diferente não é
errado, que existem religiões conforme as culturas e os valores e
que o melhor caminho para o entendimento é o debate e não a
perseguição.

Pensando
a educação

A
Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é fruto de anos de trabalho
conjunto, que en
volveu
mais de 130 especialistas, educadores e comunidade. Duas versões
preliminares para avaliação pública, 12 milhões de sugestões no
processo de consulta em 2015 e debates em conferências abertas.
Quem
não conhece o assunto, não possui mérito nem competência para
falar a respeito da educação., não deveria portanto legislar sobre
ela.

O
que vemos, no entanto, é uma proposta de escola às avessas.
Trata-se de um retrocesso que impede a construção de projetos
pedagógicos que possibilitem a escola de promover a reflexão
crítica e plural, conforme prevê a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação nacional (LDB).

Na prática, o que se vê, no entanto, é que o “Escola sem partido” pretende promover censura a liberdade de pensamento e a autonomia pedagógica no ambiente escolar

Os autores dos projetos pertencem a partidos políticos, são pastores evangélico e trazem no bojo dos projetos suas concepções políticas, religiosas e morais