Para conscientizar e promover o debate público a respeito da segurança e saúde dos trabalhadores e trabalhadoras, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estabeleceu a data de hoje, 28 de abril, como o Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho.
De acordo com o Ministério do Trabalho, o adoecimento ocupacional é qualquer alteração física ou mental que ocorre no organismo em decorrência do exercício do trabalho. Pode ser consequência da exposição a riscos ambientais e químicos (poeiras, vapores, gases e substâncias ou produtos químicos em geral), físicos (ruído, vibrações, radiações, frio, calor, umidade) e biológicos (vírus, bactérias, protozoários, fungos, bacilos e parasitas). Decorrem, também, de problemas na organização do trabalho, gerando sobrecarga física ou mental.
O SISMUC conversou com a médica sanitarista e do trabalho, June Maria Passos Rezende, que é também auditora fiscal do trabalho aposentada e alerta para a urgente necessidade do poder público voltar suas atenções para a saúde dos trabalhadores, bem como a organização da categoria para que seus direitos sejam reconhecidos. Confira:
SISMUC: Nos últimos anos, aumentaram os casos de adoecimento mental relacionado ao trabalho. Como o Ministério do Trabalho tem olhado para este tema?
June: Já me aposentei do Ministério do Trabalho há 5 anos. Mas pelo que tenho acompanhado, as ações de saúde e segurança não estão sendo priorizadas e valorizadas como deveriam ser. Recentemente foi incluída a exigência da avaliação dos riscos psicossociais no PGR – Plano de Gerenciamento de Riscos na NR1, o que deveria entrar em vigor em maio. Mas a articulação patronal conseguiu adiar por um ano. A visão e ação do Ministério do Trabalho no campo da saúde e segurança tem se concentrado na inspeção do cumprimento das normas regulamentadoras, o que é um papel importante.
Mas, entendo que o enfrentamento de uma questão complexa como o adoecimento mental no trabalho e da sua cadeia de determinação exige uma articulação intersetorial envolvendo os campos do Trabalho, Saúde, Seguridade Social e Desenvolvimento Econômico na formulação e execução de políticas públicas e ações conjuntas que venham na contramão e como forma de resistência a este processo de desregulamentação de direitos, precarização e desumanização do trabalho. Considero também fundamental o diálogo com os trabalhadores em seus locais de trabalho e uma maior aproximação com as suas representações, sejam organizações nos locais de trabalho ou sindicais.
SISMUC: Falando especificamente do serviço público, como a Prefeitura deve atuar para reduzir os casos de adoecimento mental dos servidores públicos?
June: Acho que em primeiro lugar o serviço público, seja municipal, estadual ou federal deve reconhecer a existência e considerar a gravidade deste problema. Se organizar para o acolhimento dos trabalhadores já adoecidos, proporcionando escuta qualificada e encaminhamento para tratamento de saúde adequado. Também é preciso verificar a ocorrência de sobrecarga e precarização de trabalho, as condições e ambientes de trabalho inadequados. E desenvolver estratégias de enfrentamento e combate desses processos destrutivos.
SISMUC: Como você avalia o atual cenário da saúde e segurança do trabalho no Brasil, especialmente no serviço público?
June: Avalio o cenário como muito preocupante e grave. É fundamental considerar que o que vivemos hoje neste campo, em termos de adoecimentos, mortes, e acidentes, do ponto de vista geral, particular e mesmo singular, tem determinação sócio-histórica. No pano de fundo da ocorrência destes agravos estão o sistema capitalista e as relações de produção e reprodução estabelecidas na atualidade.
Testemunhamos a acentuação da agressividade das estratégias neoliberais, pressão por desregulamentação de direitos, privatização, terceirização, produzindo intensificação do trabalho, jornadas prolongadas, sobrecarga de trabalho e trabalho extenuante. Ainda a estratégia posta pela ideologia do empreendedorismo – cada um empresário de si mesmo, vem acentuando a competição, o individualismo, o isolamento, a alienação e o empobrecimento.
SISMUC: A precarização do trabalho e o aumento da terceirização têm impacto direto sobre a saúde do trabalhador? De que maneira?
June: Com certeza. O aumento do trabalho precário e da terceirização (a qual que na maioria das vezes é também uma condição de trabalho precário), impactam de forma mais significativa na saúde dos trabalhadores. Como efeitos da precarização do trabalho à saúde estudos epidemiológicos já evidenciam maior frequência de adoecimentos, afastamentos mais prolongados por motivo de doença, aumento de risco cardiovascular, eventos cardiovasculares agudos e doença cardiovascular, redução da saúde autorrelatada, bem como crescimento do uso de serviços de saúde, aumento de distúrbios musculoesqueléticos, do uso de drogas psicotrópicas, de distúrbios do sono, burnout, suicídio, maior ocorrência de acidentes de trabalho e agravos de saúde mental.
SISMUC: Quais são os principais sinais de que o ambiente de trabalho está adoecendo os servidores?
June: Pensando nos sinais demonstrados pelo coletivo de trabalhadores, acho que insatisfação com o trabalho, falta de motivação, maior absenteísmo, afastamentos do trabalho, atestados médicos, pedidos de transferência, pedidos de demissão, rotatividade elevada, prejuízo das relações interpessoais entre colegas.
SISMUC: O que falta para que políticas públicas de prevenção deixem de ser apenas planos e passem a ser implantadas de forma efetiva?
June: Compromisso institucional e organização, pressão, consciência e luta da classe trabalhadora.
SISMUC: Como o trabalhador pode agir caso perceba que está em um ambiente insalubre?
June: O enfrentamento das questões de saúde e trabalho deve ser preferencialmente feito de maneira coletiva, já que em geral, os problemas afetam a todos que trabalham no mesmo ambiente e sob as mesmas condições de trabalho. Então, é interessante conversar com colegas, apresentar as demandas como coletivas aos responsáveis, recorrer também aos seus representantes nos locais de trabalho e ao sindicato de sua categoria.
Nas situações de conflito com a gestão é importante acionar o sindicato e os órgãos públicos responsáveis pela vigilância e fiscalização da saúde e segurança no trabalho.