A assistência social em Curitiba deixa de lado quem mais precisa

O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Luiz de Almeida, esteve em Curitiba no dia 07 de julho para o lançamento da Operação Inverno Acolhedor, programa do Governo Federal para a população em situação de rua.

De acordo com as informações do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), durante o período do inverno, sete capitais das regiões Sul e Sudeste serão contempladas pela ação, e será executada com apoio de municípios, movimentos sociais e entidades da sociedade civil. A previsão é que nos próximos anos a Operação Inverno Acolhedor seja ampliada para outras regiões do país. 

Para Silvio Almeida, o programa é uma das maneiras de resgatar a dignidade daqueles que estão mais vulneráveis. “Este primeiro movimento é emergencial, ele tem que se tornar permanente para o Estado brasileiro, independente de governo, que não dependa da nossa boa vontade. Pessoa em situação de rua (PSR) não é uma categoria que não deva ser superada.”

Como disse o ministro, esta é uma ação emergencial, para que as pessoas não percam suas vidas por causa do frio. Mas, é necessário avançar. Quem quer alimentação, quer moradia, quer saúde, emprego e renda. 

A população em situação de rua é quem é mais prejudicada

A Prefeitura de Curitiba vende a ideia de que a rede de proteção assistencial da cidade para a PSR é referência no país, mas quem precisa das políticas públicas, sente-se negligenciado. 

“Nestes últimos anos, a assistência social foi sucateada. E, a população de rua aumentou muito, perderam a moradia, o acesso à educação e à alimentação. O Estado não garantiu o mínimo. Aqui em Curitiba, tivemos que judicializar o município para ter acesso a um copo d’água, a alimentação.” Foi a fala de  Leonildo José Monteiro Filho, coordenador do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, durante a 1ª Conferência Livre de Assistência Social em Curitiba, que aconteceu no SISMUC. 

Além disso, há falta de orçamento para aplicação das políticas públicas. Danielle Dalavechia, representante do segmento de usuários e presidente do Conselho Municipal de Assistência Social, aponta que “Precisamos brigar por um orçamento mínimo para a assistência em Curitiba, que hoje é de apenas 0,82%, não chega a 1%. É assim que aprimoramos, construímos e qualificamos as políticas de assistência social”. 

Não apenas os usuários, mas os trabalhadores e trabalhadoras da assistência social também perderam direitos. Os servidores da rede municipal sofrem assédio moral constante, com a falta respeito pelas chefias ou por precisar cumprir determinações que não constam no regimento da FAS. 

De acordo com os servidores sindicalizados ao SISMUC e que atuam na assistência social, a falta de valorização profissional e o arrocho salarial a que foram submetidos, impactam na motivação para o trabalho.“Tudo isso reflete no trabalho realizado e que é percebido pela sociedade e pelos usuários. Se a FAS conseguir atuar no sentido de sanar essas e outras demandas, o trabalho terá melhores resultados, pois os trabalhadores têm vontade, têm compromisso com esta população que vive a condição mais vulnerável socialmente, mas sem as condições adequadas não consegue realizar o trabalho que deveria ser prestado pelo município.”

A omissão da gestão municipal durante a pandemia

Durante um dos piores períodos já enfrentados no mundo, a pandemia da Covid-19, Curitiba violou os direitos da PSR. A prefeitura não realizou as ações necessárias para

salvaguardar a vida da PSR, problemática demonstrada e comprovada por Leticia Gzebieluka Alves em seu trabalho de conclusão de curso em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Paraná.

Em sua pesquisa, construída a partir da análise da linha do tempo de 2020 a 2021, avaliando as demandas da população em situação de rua enquanto grupo mais vulnerável à pandemia e, as ações realizada pelo poder público e pelos movimentos sociais, Leticia concluiu que as ações necessárias requeridas para a Prefeitura não foram efetivadas. “Os custos das ações não eram altos, como comprovam os documentos, mas mesmo assim as ações não foram realizadas. Quando o Estado escolhe não fazer uma ação que é de supra necessidade para salvaguardar a vida de um grupo vulnerável, isso é uma ação de omissão, e a omissão, segundo [Achille] Mbembe, é deixar morrer, e deixar morrer, é necropolítica. A Prefeitura de Curitiba foi necropolítica, segundo relatos, relatórios e documentos”, pondera Leticia. 

Organizações da sociedade civil comprometidas com a PSR estimam que existam mais de 6 mil pessoas em situação de rua em Curitiba atualmente. E a “culpa” não deve ser colocada na pandemia, pois os dados oficiais do CadÚnico (base de dados do Governo Federal), indicam que o período mais crítico em Curitiba foi o ano 2019, quando 593 famílias passaram a viver nas ruas.

Considerando esses números, Leticia questiona “como a rede socioassistencial pode ser suficiente se, por exemplo, existem apenas 1414 vagas nos equipamentos da FAS? Quanto da gestão visa gerenciar a crise visando superar a situação de rua?”. 

Foi pelo trabalho das organizações da sociedade civil e entidades de defesa dos usuários que houve a luta pela garantia do mínimo para quem estava nas ruas durante aquele período. Aliás, as entidades seguem lutando dia a dia, antes e pós-pandemia.

O SISMUC realiza visitas constantes nas unidades de acolhimento e nos Centros POP, identificando que um local que deveria proteger e acolher a população que está em situação de rua e de vulnerabilidade, na verdade os deixa em condição de abandono e desleixo. Já denunciamos diversos casos envolvendo a Fundação Ação Social de Curitiba e seguimos pautando os temas para que haja fortalecimento das políticas públicas e valorização dos servidores municipais. 

“A Assistência Social tem que atuar fortemente na prevenção para evitar que a pessoa chegue ao ponto de ir para a rua e os problemas e demandas se multipliquem”, complementam os servidores. 

XIV Conferência Estadual de Assistência Social do Paraná
Os delegados da 15ª Conferência Municipal de Assistência Social elegeram os representantes para a Conferência Estadual, e aprovaram as resoluções e moções de apoio. A conferência estadual acontecerá de 3 a 5 de outubro, em Cascavel.