Normativa da gestão sobre videoaulas deixa mais dúvidas do que certezas

A educação infantil de Curitiba vive muitas incertezas nesse
cenário ocasionado pela pandemia do novo Coronavírus. Com as aulas suspensas –
uma reivindicação da categoria e do sindicato para preservar a saúde de
servidores e alunos, bem como de seus familiares – a falta de diálogo com a
gestão sobre reposição gera ainda mais dúvidas na categoria.

No Diário Oficial desta quarta-feira (15), a Prefeitura
publicou uma instrução normativa, inserindo as atividades pedagógicas virtuais
para Educação Infantil, somente na Pré-Escola, Ensino Fundamental, Educação de
Jovens e Adultos (EJA) Fase I e Educação Especial da rede municipal de ensino.

Muito
antes da instrução ser publicada, o SISMUC e o SISMMAC já haviam enviado
ofício para a Prefeitura exigindo uma reunião para debater o ensino virtual.

Os sindicatos vêm cobrando da gestão que haja diálogo para tomada de decisões,
afinal, essa é uma situação completamente nova e, por isso, é muito importante
que as decisões sejam tomadas em conjunto. Mas, se o mundo todo mudou por
conta da pandemia, a intransigência da gestão Greca continua a mesma.

A normativa também não garante
que o trabalho remoto realizado entre os dias 13 de abril e 02 de maio poderá
substituir as aulas presenciais. A Prefeitura tem tratado a questão de forma
ambígua em suas matérias e documentos oficiais. A administração não pode
decidir sozinha se as aulas à distância servirão ou não na contagem das 800
horas porque isso depende de um posicionamento do Conselho Nacional de
Educação. 

Chama a atenção que essa normativa só foi publicada dois
dias após o início da transmissão das aulas, gerando ainda mais apreensão e
incertezas. E ainda a normativa é insuficiente e não responde a todos os anseios da
categoria sobre a reposição, formas de avaliação e qualidade do ensino.
No
caso das professoras de crianças de 0 a 3 anos tudo fica ainda mais incerto, já
que não existe nenhuma instrução.

De
acordo com a instrução normativa, a Secretaria Municipal de Educação (SME)
vai disponibilizar videoaulas, numa parceria com a Secretaria de Estado da
Educação e do Esporte (SEED). Esse material será apresentado num canal aberto
de televisão, no Portal
da Educação e
na página oficial da Secretaria Municipal da Educação no Facebook.
As aulas vão de segunda a sexta-feira, seguindo um cronograma preestabelecido,
com revisões aos sábados. Além disso, os alunos devem usar um caderno para
registros de atividades.

Nesse formato, cabe aos professores dos CMEIs:
I – Assistir as videoaulas, de segunda a sexta-feira, em conformidade com as
turmas que atuam e registrar os conteúdos trabalhados;

II – Fazer anotações referentes as aulas para
posteriormente retomar os conteúdos nas aulas presenciais;

III-realizar as atividades propostas pela equipe
pedagógica e administrativa de acompanhamento;

IV- Fazer o diagnóstico da turma para refletir sobre o
seu planejamento de ensino, observando até onde foi possível desenvolver com
suas crianças, os conhecimentos previstos diante do que estão sendo explicitados
nas videoaulas e como poderá dar continuidade ao planejamento quando retornarem
as aulas presenciais;

V- Validar os registros/portfólio da criança por meio das
atividades propostas pelas videoaulas no retorno das aulas presenciais.

Ou seja, fica claro que, nesse período, as professoras e
professores de educação infantil estarão tão – ou até mais – atarefados do que
num período de aulas normais.
Mas, a normativa não estabelece como será contabilizado
esse período de trabalho, já que ainda existe a possibilidade de reposição, uma
vez que os conteúdos trabalhados nesse formato terão que ser retomados em sala
de aula. Será que a secretaria de educação quer que os professores trabalhem
dobrado sem receber nada a mais para isso?

Chama a atenção também o item IV, que exige que os
professores façam o diagnóstico do aprendizado da turma. Como fazer isso
sem qualquer contato com os alunos e desconsiderando os alunos do ensino
especial ou crianças em vulnerabilidade social?

Limitações na educação infantil e ensino especial

Se o sistema de educação a distância pode ser questionado em
todos os níveis de ensino, a situação é ainda mais preocupante quando se trata
da educação infantil e do ensino especial.

A interação com as crianças por meio de telas e aplicativos está
longe de ser ideal. Em nenhum momento a experiência de assistir a uma aula na
TV – com professores que as crianças sequer conhecem, já que as videoaulas são
as mesmas para toda a rede – com a experiência vivida em um CMEI.

A educação infantil não se baseia só em apresentar conteúdo
ou alfabetizar crianças com a maior urgência. A educação infantil está baseada
no desenvolvido de múltiplas habilidades no ser-humano. Muito mais do que
decorar letras ou números, a educação infantil precisa da convivência e da
interação humana.

Para os alunos com deficiência, a situação é ainda mais
preocupante. É muito grande o descaso da gestão em querer impor para esses
alunos o mesmo estilo de ensino, ignorando completamente as necessidades
específicas de cada um.

Realidade social

Imaginar que crianças possam aprender por meio de uma tela
de televisão já é difícil mesmo para aquelas que possuem acesso facilitado à
internet e à TV e apoio de familiares para auxiliar nas tarefas. Mas, e para as crianças que não
têm essas condições?

Ao
propor esse modelo de ensino a distância, a gestão ignora uma realidade
que na verdade corresponde à maioria dos alunos. Para muitos, um computador com
acesso à internet é uma realidade distante, e mesmo a TV não está presente em
todos os lares.

Mais grave ainda é pensar que muitas crianças não têm nenhum
apoio familiar que ajude a acompanhar as aulas. E o pior: muitas são as
crianças que sofrem violência ou presenciam cenas de violência dentro de suas
próprias casas. Como imaginar que eles possam aprender algo no período de
quarentena?

Impor a educação à distância nesse cenário só faz ampliar
ainda mais a desigualdade social presente em nossa cidade.