Em um vídeo que circulou ontem (8/1) na imprensa, a Assistência Social de Balneário Camboriú (BC), Santa Catarina, acusa a Prefeitura de Curitiba de comprar passagens para enviar pessoas em situação de rua ao município catarinense. Em nota oficial, a FAS, responsável pela mobilidade da População em Situação de Rua (PSR) na cidade de Curitiba e demais serviços ofertados a este segmento, afirma incisivamente que não destinou passagens para os usuários que foram para Balneário Camboriú. Na mesma mensagem, a Fundação apresentou os critérios para a pessoa ter direito a uma passagem para outra cidade, como ter familiares na cidade de destino e/ou retorno à cidade de origem.
O SISMUC ressalta que estes critérios são impedimentos à livre circulação da população no território nacional e precisam ser revistos. É importante destacar que, tanto Curitiba quanto Balneário Camboriú, são cidades que praticam abertamente a política higienista e, impedir a entrada, a saída ou o deliberado envio de pessoas para outras cidades, contra a sua vontade, constituem violação de direitos humanos e do direito à cidade.
A denúncia, que causou uma crise entre os municípios, aponta, mais uma vez, a necessidade permanente de um olhar crítico sobre as práticas e políticas municipais e governamentais acerca da inclusão e garantia dos direitos desta população que sofre com a vulnerabilidade social.
Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgados em dezembro de 2023, revelam uma crise nacional crescente, com um aumento de mais de 1000% na população em situação de rua desde 2013. Em relação à Curitiba, a realidade não é diferente, segundo o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), em setembro de 2022, a capital paranaense ficou em 6º lugar no Brasil com a maior porcentagem de PSR, totalizando 3,4 mil pessoas, correspondendo a 1,5% da população local. A situação no estado do Paraná não é menos preocupante, com 13,3 mil pessoas em situação de rua e uma taxa de 5,7% de brasileiros.
Diante desse contexto, a controvérsia entre as prefeituras sublinha a urgência de uma abordagem humanitária, organizada e inclusiva para lidar com essa complexa realidade social. Adicionalmente, é primordial ressaltar o direito constitucional de ir e vir, especialmente crucial para aqueles sem moradia fixa. Em um país em que o deslocamento é uma realidade para a população em situação de rua, políticas públicas que atendam à dignidade e respeitam os direitos fundamentais são imprescindíveis.
Plano Ruas Visíveis: Pelo direito ao futuro da população em situação de rua
No final de dezembro de 2023, foi lançado o “Plano Ruas Visíveis – Pelo direito ao futuro da população em situação de rua”, uma ação do governo federal que atravessa 11 ministérios e visa estabelecer uma agenda de políticas públicas voltadas aos sem tetos do país. O programa está orçado em R$ 982 milhões e prevê ações de assistência social, acesso a alimentos, atendimentos à saúde, habitação, formação profissional, entre outras iniciativas.
Além desse plano, outra notícia positiva é a sanção da Lei Padre Julio Lancellotti, que visa combater ações higienistas e mesmo agressivas contra pessoas em situação de rua. Essa legislação é um importante passo na luta contra práticas como a chamada “arquitetura hostil”, que instala obstáculos ou objetos em áreas públicas que impedem o uso do espaço por essa população vulnerável.
O coordenador da Pastoral do Povo de Rua da Igreja Católica, Padre Julio Lancellotti, destaca-se por seu trabalho incansável na defesa dos direitos dessa comunidade. Ele foi alvo do ódio de grupos de extrema direita devido ao seu engajamento contra ações discriminatórias. Vale ressaltar que São Paulo, onde o sacerdote atua, conta com quase 60 mil pessoas em situação de rua, cerca de um quarto dos 221 mil brasileiros nessa condição e quatro vezes mais do que há uma década. Essas iniciativas refletem a urgência de uma abordagem humanitária e inclusiva para enfrentar a crise da população em situação de rua no Brasil.