Fonoaudiólogas sofrem com o descaso da gestão municipal

A população de Curitiba tem dificuldade para conseguir consultas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e aguardam em filas quase que eternas para a realização de exames de rotina ou atendimento com um clínico geral. É comum que com a demora, haja desistência do atendimento, seja porque o paciente já melhorou e não precisa mais ou porque acaba buscando a rede particular como um plano B — quando há condições financeiras para isso. 

Se essa dificuldade existe para as consultas generalistas, o cenário é ainda pior nas consultas mais específicas, como no caso da fonoaudiologia. Atualmente, Curitiba conta com apenas 8 fonoaudiólogas, lotadas na atenção primária e 3 lotadas na atenção especializada. Este número é ínfimo se considerarmos que a cidade registra cerca de 1,5 milhões de usuários da rede pública de saúde, cobrindo quase 76% da população local. 

O aumento no quadro de profissionais é essencial. Mas, desde o início da fonoaudiologia no NASF [Núcleos de Apoio à Saúde da Família], a gente já tem um número muito reduzido [de profissionais] em comparação às outras categorias. Mesmo que houvesse a entrada de mais duas ou três profissionais, ainda sim seria pra tapar buraco”, aponta Luiza (nome fictício), fonoaudióloga da rede pública de Curitiba. 

Além de estarem em um pequeno número, as servidoras ainda precisam dividir o tempo de trabalho para realizar tarefas administrativas. São elas que organizam e montam as agendas de atendimento nas Unidades de Saúde. “Ao longo do tempo fomos assumindo a função de organizar as filas de atendimento, o que toma muito tempo da nossa carga horária. Além disso, nenhuma das funções agregadas ao longo dos anos, inclusive durante a pandemia, nos foram retiradas. E nenhuma das solicitações que fizemos para dar agilidade ao atendimento foram cumpridas até hoje”, desabafa Manuela (nome fictício), fonoaudióloga. 

Filas para atendimento ambulatorial 

Os atendimentos de fonoaudiologia nas Unidades de Saúde são aqueles de baixa complexidade, para orientações, monitoramento ou a finalização de um exercício feito pelo paciente. Já os tratamentos de média e alta complexidade precisam ser feitos em uma clínica. O problema é que atualmente não há clínicas conveniadas para atender a demanda e a Secretaria Municipal de Saúde ainda não apresentou uma solução oficial para essa questão. Há rumores de que está sendo estudada a possibilidade de que os tratamentos ambulatoriais possam ser realizados nas UBS. 

“A clínica conveniada solicitou o descredenciamento em 2019 e, desde então, a única oferta ambulatorial disponível para atendimentos fonoaudiológicos é a Clínica-escola da Universidade Tuiuti do Paraná, que além de ofertar um número reduzido de vagas, é inviável financeiramente para a população mais carente, pelo preço da passagem e tempo de deslocamento das regiões mais ao sul da cidade, conforme enfatiza Lúcia (nome fictício).

O SISMUC conversou com as servidoras e todas apontam que as salas nas Unidades de Saúde não são adequadas para o atendimento clínico. “Numa unidade de saúde você vai ter na sua sala uma balança, maca, às vezes não tem nem pia pra lavar a mão, que é bem importante, pois dependendo, precisa colocar as mãos na boca da criança. A questão de não ser adequado é também pelo nível de complexidade, pois a Unidade de Saúde é de Atenção Básica — sendo prioritariamente ações de promoção e prevenção de saúde, ou baixa complexidade. O atendimento sistemático de fono é de média complexidade, por isso deve ser ambulatorial”, ressalta Manuela.

Bruna Lúcia (nome fictício), também fonoaudióloga da rede pública, completa: “estamos lotadas em uma atenção básica de saúde. Então é preciso respeitar esse âmbito. Essa é uma discussão que precisa ser feita, os níveis de complexidade precisam ser respeitados. Se a gente organizou um SUS com níveis de complexidade, as ofertas de serviços devem seguir isso”. 

Manuela afirma que a fila para tratamento ambulatorial não anda desde 2017 e estima que só de crianças são mais de 2.000 aguardando atendimento. “Mesmo que hoje decidissem deslocar a gente para uma clínica, não daríamos conta de atender todos que estão aguardando na fila”. 

O aumento do quadro de profissionais é essencial 

As trabalhadoras indicam que para voltar à qualidade no serviço que a população merece, é fundamental aumentar o número de fonoaudiólogos. “Eu penso que deveriam ter pelo menos duas profissionais por distrito”, afirma Luiza. Além disso, a Prefeitura precisa garantir locais para o atendimento ambulatorial. “O ideal seria que a Prefeitura tivesse ambulatórios próprios para atendimento e não com terceirizadas”, propõe Bruna Lúcia.

O SISMUC também defende a retomada e fortalecimento do NASF — eliminado pelo governo anterior. Com o desmantelamento deste programa, as famílias brasileiras assistidas pela saúde pública perdem o acesso a assistentes sociais, psicólogos, fisioterapeutas, nutricionistas, farmacêuticos, fonoaudiólogos, entre outros profissionais. 

Exigimos que a Prefeitura de Curitiba ofereça o serviço em sua totalidade. De nada adianta prometer à população a existência de um serviço que, na prática, não chega a quem precisa dele. Assim como manter servidoras trabalhando até o seu esgotamento físico e mental.